quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Capítulo 24 – Esperança

O prazo de Cruner para a procura do colar esgotava-se e ainda nem sinais dele tinham sido encontrados na velha e destruída casa. Decidimos revelar a existência do colar ao resto da família e juntaram-se para nos ajudar o pai, os tios e os primos de Luciana, assim como elementos da família do Mickael e da minha. No entanto toda esta ajuda parecia pouca. O maldito colar não aparecia e com isto os mais pessimistas começavam aos poucos a desistir. Em objeção, Mickael ficava todo o dia sem desviar os olhos da casa uma única vez. Não desconfio que, se o permitíssemos, ficaria também toda a noite a procurar. E foi graças a esta enorme força interior de Mickael que a nossa esperança regressou: quando o sol começava já a esconder-se entre o horizonte de arvoredos e o dia de entrega do colar se aproximava, Mickael chamou-nos a todos em euforia – acabara de encontrar um conjunto de minúsculos diamantes que obviamente pertenciam ao colar.

Todos se deslocaram até ao local e de seguida as atenções desviaram-se para Constança.

- Sim. Sem dúvida que pertence ao colar!

No entanto esta descoberta podia significar não só que o colar estava próximo, como também que este estava destruído. Dúvidas e receios se instalaram entre todos mas a força pela procura aumentara significativamente.

Horas depois, já em plena escuridão da noite e com a ajuda apenas das luzes das lanternas, encontraram, finalmente, o valioso colar. Aparentemente estava como novo, mas Constança, que mais do que ninguém tão bem o conhecia, notou-o desfigurado do seu estado original.

Os que nunca o tinham visto verificaram de perto e embora os mais pobres ou ambiciosos desejassem interiormente vende-lo, todos concordaram que a vida de Luciana era mais valiosa.

Com isto o problema que se seguiu, foi decidir quem iria no dia seguinte à meia-noite para a floresta, encontrar-se cara-a-cara com o Cruner para lhe entregar o colar. Foi um problema aparentemente complicado que teve fácil resolução – adivinharam que Mickael gostaria de ser o herói da sua amada e o primeiro a voltar a vê-la e este aceitou sem quais queres dúvidas.


             *                              *                              *                               *       


Acordei com um raio de sol a clarear-me as pálpebras dos olhos e dei por mim desamarrada. Recordei o que se sucedera antes de ter ficado inconsciente e senti uma enorme raiva.

Olhei para a janela. O tamanho dela, embora pequeno, dava para eu fugir se não fosse a grade de três ferros que a protegia. Imaginei que se conseguisse retirar o ferro do meio e afastar os outros dois, conseguiria fugir, e não hesitei em experimentar fazê-lo. Sabia que para retirar a do meio iria precisar de algum instrumento, mas talvez conseguisse entortar as outras duas com a força das pernas. Entretanto, ao tentar, dei de caras com um dos homens de Cruner a olhar para mim, do outro lado da janela. Riu-se para mim maleficamente e virou costas. Arrependi-me de imediato. Que estupidez a minha!

Minutos depois Jayden entrou na cave com uma corda na mão e, evitando trocas de olhares comigo, aproximou-se.

- Tenho de te amarrar. – Agarrou-me gentilmente os braços.

- Agora já falas comigo?

- Não temos mais nada para falar para além disto. Mas se quiseres posso começar a amarrar-te sem te avisar.

Desta vez sentira-me ofendida.

- O que se passa contigo? Não pareces o mesmo que me pediu ajuda para fugirmos daqui. Pensei que fossemos amigos!

- Luciana, esquece isso. Não há qualquer forma de conseguirmos sair daqui vivos. Eles estão por todo lado. Não há nada a fazer. Agora deixa-me amarrar-te, a não ser que queiras que te magoe.

- Agora és como os outros? Também me bates?

- Tu é que estás a pedir.

Empurrou-me contra a parede e amarrou-me os braços atrás das costas. De seguida amarrou as cordas dos meus pulsos às grades da janela evitando, mais uma vez, o contacto com os meus olhos e saindo sem dizer mais nada.

Não percebia a atitude dele. O Cruner só lhe podia ter feito uma lavagem ao cérebro, porque aquele não era o Jayden que conhecia. Ou que pensava conhecer. No entanto aquilo que ele dizia era difícil de desmentir - parecia completamente impossível qualquer tipo de fuga.

Sabia que aquele era o dia dos meus pais entregarem o colar ou eu morrer, ou ambas as coisas, e o meu medo aumentava a cada segundo. Não sabia se por "gostar" de mim o Cruner me deixaria escapar viva, a mim e à minha família, em troca do colar, ou se daquele momento a umas horas iria ver a minha família a morrer. Se isso fosse acontecer preferia, pelo menos, que me matassem aqui dentro, sem ninguém me ver a morrer nem eu ver ninguém a morrer por mim.

Dentro destes pensamentos as horas foram passando até que anoiteceu.

De repente senti algo nos meus pulsos, a mexer-se. Tentei olhar para trás e um par de mãos reviraram-me a cabeça de novo para a frente, assustando-me. Com isto alguém me sussurrou ao ouvido: «Calma. Não te mexas… não fales.» Não fazia a mínima ideia quem era, mas tentava ajudar-me. Desamarrou-me e sussurrou: «Não digas nada quando me vires!» Lentamente, virei-me para trás e vi Matias. Todos os meus sentidos se baralharam e tentei controlar-me. Quase não acreditava no que via. Permaneci calada enquanto ele, completamente calmo, retirava os ferros com instrumentos previamente pensados. Mal acabou observou a cave por dentro.

- Não acredito que estiveste três dias dentro dessa coisa.

Agarrou-me a mão e estremeci, como se só agora que senti a pele dele pudesse acreditar verdadeiramente de que ele é real e que aquilo está a acontecer. Foquei o lado de fora e não estava ninguém. Sabia que não iria demorar muito para sermos apanhados. Saí da cave e mal pousei os pés na terra, desatamos a correr. Uma enorme escadaria estava à nossa frente e como não teria forças suficientes para a subir, pegou em mim. À nossa frente apareceram imensos corredores feitos de plantas - parecia um labirinto. Avançamos pelo caminho que provavelmente Matias tinha percorrido até me ter encontrado na cave. Ouvíamos passos por todo o lado. Sabia que eram os homens de Cruner pois estes andavam constantemente a vigiar todo o redor do edifício. Desviamo-nos para um campo recheado de árvores velhas e escondemo-nos entre as plantas.

Continuou a ser apenas ele a falar.

- Parece que já estamos livres, mas à volta de tudo isto existem muros bem grossos a fechar tudo. Para conseguir entrar tive que escavar um buraco por baixo deles e para isso tive que planear muito bem uma forma de fazer isso sem ser apanhado. Assim como tive que planear que tipo de instrumentos poderia ter que usar – Apontou para a ferramenta que usara para retirar a grade, que eu desconhecia – Agora temos que nos dirigir ao buraco que fiz, mas neste momento já o devem ter visto e já devem estar todos à nossa procura…

- Como soubeste que fora raptada? – Falei finalmente. – Pensei que…

- Luciana, depois explico-te tudo… Se sairmos daqui vivos.

Ele tinha razão. Observamos à nossa volta e vimos, do outro lado do campo, um pequeno portão que nos levava a mais corredores como aquele que nos levou até ali. Dirigimos essa direção, percorremos esses corredores e vimos, num deles o Karlles, a correr de costas viradas para nós, na direção de um outro homem. Seguimos uma outra direção, cada vez mais nervosos.

- Não podemos sair pelo buraco que fiz. – Divulgou Matias.

Decidimos procurar o muro e fazer um novo buraco num sítio escondido para que ninguém nos apanhasse enquanto escavávamos. Minutos depois, a correr e a esgueirar-nos entre os vários homens que nos procuravam, encontramos o grandioso muro e suspiramos de alívio. Escavamos furiosamente o buraco.

Tudo aquilo que acontecia naquele momento me parecia completamente irreal pois dos três dias que ali estivera nunca imaginara uma fuga como aquela. Nunca imaginei que fosse o Matias a vir-me ajudar e nunca pensei que as defesas de Cruner contra as fugas dos seus prisioneiros fossem assim.

Pareceu uma eternidade até termos conseguido escavar a maior parte do buraco, Matias exigiu que eu fosse a primeira a avançar. Enquanto me enfiava no buraco escavei melhor o pouco que faltava e a irrealidade do momento aumentou mais. Não acreditava que estava livre. Ajudei o Matias a passar para o meu lado e abracei-o. Rimo-nos de felicidade e corremos entre a floresta para bem longe daquele lugar.


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